domingo, 16 de dezembro de 2018

Num dia 16

Uma princesa
Um plebeu
E uma criança que mal nasceu
E se foi

A maldição da ganância
Que bota o amor pra correr
E que volta, quase que ao contrário
Para vê-lo novamente nascer

O menino que se vai antes do tempo
O homem que se retira mais cedo
Antes do Sol raiar

O tempo, que não volta, mas tenta
Em outro momento-lugar
É a fé, a coragem e a vida
Que persiste, insiste:
É essa que veio reinar.

domingo, 3 de junho de 2018

Treze de maio

O papel é um lindo que aceita tudo, inclusive a ideia de que somos livres.

A escravidão de negros, que é a mais próxima da história do Brasil, tinha o caráter físico de dominação, evidente, mas era um pouco mais cruel do que "apenas" físico.

Antes de trazer as pessoas para cá, os dominadores obrigavam os povos a dar sete voltas ao contrário da árvore-mãe de sua tribo, sabendo que isso simbolizava renegar sua força, sua ancestralidade, sua devoção e o cerne de sua existência neste mundo. Cruel.

Cruel e, sobretudo, ineficaz.

Assim como, para além do caráter econômico, em nossa escravidão contemporânea percebemos também o fator psicológico, o social, o cultural, etc..., temos a oportunidade de libertação ao nos ligar com nossa essência, que tudo é.

Seja por meio de um transe ritualístico, de um momento intenso de prazer, do calor de um abraço ou da paz de se atender interna e verdadeiramente, experimentamos a liberdade, ainda que estejamos aprisionados no corpo físico e sujeitos a todos os emaranhados de dominação que existem na matéria. Somos, portanto, verdadeiros escravos de espírito livre.

Parece confuso, mas já que o papel é democrático, a linda da Cecilia Meireles registrou em seus escritos o seguinte: "Liberdade: uma palavra que o sonho humano alimenta. Que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda."

Petisco: Canto das Tres Raças, na voz de Clara Nunes

sexta-feira, 1 de junho de 2018

Às vezes - um pouco - doente


Às vezes a gente fica um pouco doente: a gente teima em algum comportamento e o corpo diz: pare, agora. E a gente é obrigado a mudar tudo e dar atenção para quem a gente devia ter dado atenção. O corpo? Também.

Antes de chegar no nível da fala, o pensamento pode ser mudado. Antes de chegar no nível do hábito, o pensamento também pode ser mudado. Mas ele nunca pode ser mudado se não for percebido.

Perceber é o primeiro estágio para a mudança de pensamento. Sim, a mente não dá trégua e não quer mudar assim, sem mais nem menos. Mas querida, minha vida é um Universo e o que eu precisar mudar em você para abraçar, explorar e me deleitar nesse Universo eu vou. Sinto? Nada, quase nada, só uma pontinha de apego que, a mando da mente, corre comendo poeira, tentando me atazanar.

Às vezes, um pouco, doente. Percebo, aceito, investigo, descubro, combato e sigo adiante. Gratidão ao chuveiro, à cama, ao alimento e aos escritos que me acompanham enquanto o corpo fica aqui, quentinho e quietinho, conversando, argumentando e silenciando a mente.

Petisco? Um vitaminado, por favor! ^^

domingo, 1 de abril de 2018

Hoje é Páscoa


Hoje é sobre chocolates, sobre almoço de domingo, sobre feriadão, viagem, curtição, bebedeira e música alta.

Antigamente era sobre o florescimento da primavera, sobre a libertação dos hebreus diante dos egípcios, sobre a ascensão de Jesus aos céus, sobre a Lua cheia... antigamente era sobre o sagrado. Não é mais.

Eu sinto a Páscoa diferente de como sinto o Natal. Por mais que haja o apelo comercial, ele parece menos alarmante do que no final do ano - e talvez menos possível, já que não existe um salário extra nessa época do ano.

De qualquer forma a reflexão sobre a conexão essencial se perde na nossa sociedade e vejo muito mais gente se endividando para pagar ovo de chocolate do que procurando sentir o sagrado deste momento.

Tudo isso é válido também, já que estamos nesse constante ciclo de experiências e aprendizado e se optarmos por beber, curtir, meditar, comer ou dormir o dia inteiro temos todo o direito também. Só penso que para tudo devemos tentar ver sentido, senão nem mesmo a curtição terá seu proveito. Bom: a Páscoa está aí: o que vamos fazer?

terça-feira, 13 de março de 2018

Aceitar a tristeza para ter mais alegria


Vivemos numa sociedade em que a tristeza é marginalizada e a busca pela satisfação constante é fomentada de tal maneira como se fosse indispensável estar o tempo todo feliz... e como se fosse possível. Logo, a existência da tristeza ainda é contestada, porém sua utilidade é inegável.

Estar triste é indesejado, ninguém deseja se sentir mal, mas assim como todos os outros sentimentos, ficar triste é algo que surge sem que a gente escolha, algo como uma reação instintiva a determinado estímulo associado ao estado emocional do momento em que ele, o estímulo, ocorre.

Você não precisa ser adepto à ideia de forçar um comportamento, afirmando o tempo todo que é feliz para tentar se convencer. Não é bem assim que funciona; existem inúmeros fatores internos tão emaranhados que nos impede de simplesmente alterar o humor a partir de um único comando.

O que também não justifica prolongar o sentimento de tristeza emendando numa autopiedade, dependência afetiva, abusos de substâncias químicas e atitudes intempestivas que podem trazer danos maiores e permanentes.

Tudo é de se sentir e de se viver. Alegria e tristeza podem ser antagônicas, mas são complementares. Assim como todos os opostos da Natureza. Quando a gente se permite aceitar no momento em que a tristeza chega, progressivamente, os momentos de alegria tendem a ser mais lúcidos também.

Petisco: Ludovico Einaudi, Waterways. Uma belíssima música instrumental que faz a gente passear por dentro de nós mesmos.

Olhando para o céu


Quando eu olho pro céu eu vejo o quanto toda a paisagem embaixo é pequena.

Isso me conforta, me contenta e me anima. Saber que toda essa bagunça é ínfima perto de todo o Todo que existe. 

A gente vê tanta vida ir embora que às vezes parece normal viver meio morto... Mas não é. Nem normal, nem digno, nem preciso.

Na verdade viver meio morto é uma perda de tempo. Porque passado o momento de assimilação do aprendizado pela quase morte, sabemos que o ar pode voltar a preencher nossos pulmões, então por que não sentir isso também?

Respire fundo agora. Mesmo.

Olhar pro céu e ver as nuvens deslizando lentas e constantes nos faz pensar que nós, tantas vezes nos sentindo tão esfacelados, também podemos seguir nossos caminhos com a mesma integridade que a Natureza nos demonstra, porque somos parte dela.

Este mundo foi construído, mas fazemos parte é do céu.

Petisco: We Are All Made Of Stars - Moby

terça-feira, 6 de março de 2018

Sois nuvens


Independente do quão densa pareça a neblina, eu sei que existe um Sol atrás das nuvens.

Hoje acordei e a manhã estava assim, com o céu todo encoberto, cinza bem clarinho, tão sutil que eu pensei que estava garoando.

Eu particularmente acho um charme ver o dia nublado, porque é como se o Sol estivesse discreto, sem pretensão de chegar com tudo a ponto de incomodar as pessoas. Ele está lá, afinal o dia está claro, mas não precisamos sofrer por causa disso e queimar nossa pele!

Com a gente também é assim: nós temos luz, tanta e tão forte que mal podemos acreditar quando algo inexplicavelmente fantástico acontece! Mas a gente esquece.

Tem dia que a gente esquece da luz, do Sol, da vida e só enxerga névoa, cinza, neblina. O dia claro é opaco ou o Sol que brilha arde, mas pra gente tanto faz. Tem dia que tudo tanto faz.

Aí vem a noite e convida, envolve e as horas passam. Um momento de sono acontece e o dia seguinte se mostra tal qual como você se sente: com o Sol escondido. "Finalmente alguém como eu! Opaco, cinza, turvo,
sutilmente úmido,
fresco,
novo,
limpo..." Então eu percebi ali, naquele cumprimento matinal, que eu e o dia, em tudo o que somos, ambos podemos estar plenos!

Hoje quando acordei percebi que estava ultimamente tentando guardar minha luz só pra mim mesma, escondendo o meu brilho como se eu precisasse economizar energia, como se meu estoque fosse limitado.

Mas se o Sol é todo luz, energia e vida, não há o que precise esconder ou poupar! Há apenas o que irradiar, espalhar, vivificar, trocar, que a fonte se renova!
Nos dias em que o Sol se guarda, dentro ou fora do meu peito, existe sim a paz e tudo de bom que a vida irradia, porque independente do quão densa pareça a neblina, eu sei que existe um Sol atrás das nuvens.

Petisco: Carry on, do Angra. Fabulosa!

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

"Veraneio vas..." da cor que você quiser!


Hoje vamos falar da Veraneio, a SUV antigona da Chevrolet.

Produzida de 1964 a 1989, este carrão possui avantajados 5,1m de comprimento, 1,9m de largura e 1,73m de altura. Para se ter uma ideia do tamanho, a badalada Tucson, embora tenha altura e largura similares (próprios da categoria), apresenta notáveis 70cm a menos de extensão.

Durante os primeiros 5 anos, o nome desse carrão era C-1416, mas ele não era convidativo e logo essa belezinha foi rebatizada com o sugestivo nome Veraneio, já que seu espaço interno poderia acomodar até 9 pessoas que tinham a opção de entrar e sair dela confortavelmente por uma de suas 4 portas. Um luxo, não?!

Porém, apesar do pleno conforto para os passeios em família, essa coisa linda logo foi notada em seu potencial para transportar pessoas em momentos pouco prazerosos. É que a robustez e potência da Veraneio faziam uma ótima combinação para que ela fosse usada como ambulância, rabecão e também como viatura policial ("Veraneio vascaína, vem dobrando a esquina...")

Em 1994, apesar de não ser mais fabricada já há 5 anos aqui no Brasil, a Veraneio foi oficialmente substituída pela Blazer que, invariavelmente, acabou tendo destino similar à sua precursora.

Os tempos mudaram e este design não atrai mais muita gente, mas é inegável o fato de que, apesar de ter se tornado obsoleta, a Veraneio dominou a cena nas montadoras por gloriosos 25 anos, enquanto que sua substituta vanguardista (que eu particularmente aprecio muito!), a Blazer, foi fabricada aqui por apenas 6 anos.

Logo, para além da diferença da velocidade com que haviam avanços tecnológicos entre as décadas de 60 e 90, é impossível negar a funcionalidade e o charme dessa lindeza robusta que é a Veraneio.

Petisco do dia: claro! Veraneio Vascaína, originalmente uma canção do Aborto Elétrico, muito famosa pela regravação feita pelo Capital Inicial.

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Exposição sobre Renato Russo no MIS



Hoje vou falar da visita que fiz ao MIS, o Museu da Imagem e do Som. A exposição atual é sobre o Renato Russo, ícone do rock nacional e da música brasileira como um todo.

Quando você​ se dispõe a visitar a intimidade de uma pessoa dessas você pensa que vai ver muitas aventuras: afinal, um ícone do rock tem uma vida agitada, passagens pela polícia, se mete vez ou outra em conflitos políticos e é comparado com inúmeros outros artistas,  mas você nunca imagina o quanto essas aventuras tão distantes da sua vida e que parecem ter saído de um roteiro de cinema podem te atravessar a alma tão intensamente.

Será só imaginação minha aquele arrepio nos braços que senti logo na fila de espera para entrar na exposição? Pode ser mera expectativa da fã que eu sou assumidamente desde meus oito anos (ah, a aurora da minha vida!), mas... será?

Alguns objetos especificamente mexeram ainda mais com a minha estrutura de mero visitante que está ali apenas de passagem, curtindo uma tarde de terça-feira em que se entra de graça no museu. Teto e paredes forrados de cartas de fãs, hall de camisas, coleções de tarô e muitos, mas muitos manuscritos originais feitos por aquele que se foi cedo demais. 

Por vezes o corpo todo se arrepia, as pernas fraquejam, o ar falta aos pulmões e aquele nó na garganta brota como que uma bola de pelo de um gatinho. Mas eu, menos felina que os dois que vivem comigo, não saberia lidar com tudo o que estava ali, sem ao menos rememorar todas as canções, todas as canções, todas as canções que fizeram do meu mundo algo menos parecido com o que vejo e um pouco mais assim, mais do meu jeito.

Sensações que partem de fatos, fatos que partem de histórias, de potencial, de imaginação... de uma alma ariana sutil, sedenta de vida e arte e trancada, atada numa existência miseravelmente humana.

Almas arianas que gritam mudamente em forma de desenhos, personagens, enredos e dissertações que, em grande parte, não saem do papel. Pois é... Esse cara que estou descrevendo podia ser meu irmão, aquele que fez meu verão terminar cedo demais há exatos 23 meses na data de hoje. E eu, que nasci num 23, chego a pensar se, quem sabe, quase sem querer, as coincidências se integram neste ciclo vital infinito.

E dane-se o uso de palavras repetidas, mas recomendo a quem puder que se programe para visitar essa exposição multimídia (como tudo no MIS), pois é verdadeiramente impossível sair desse evento da mesma forma que se entrou, porque é igualmente impossível visitar o coração de um gênio ariano e sair de lá sendo apenas um pouco mais do mesmo.